4 Abril 2013
Brasileiros ajudam o futebol do Timor Leste
Emerson Alcantara é o atual treinador de Timor Leste o brasileiro quer continuar no caminho da evolução do
futebol nacional
Por MATHEUS LABOISSIERE
Um país devastado, com muitos problemas de infraestrutura, em razão do difícil processo de independência, em 1975, e também depois dele. Timor Leste foi colônia
portuguesa desde o século XVI, mas, no ano supracitado, conseguiu a independência, de forma unilateral. O movimento orquestrado por Francisco Xavier do Amaral, o
primeiro presidente do jovem país, não foi reconhecido por Indonésia, Portugal e Austrália, este último atuante como observador.
Por outro lado, seis nações aceitaram a soberania de Timor Leste (Albânia, Cabo Verde, Guiné, Guiné Bissau, Moçambique e São Tomé & Príncipe), notadamente a maioria
ex-colônias lusitanas. Tudo se encaminhava bem, mas, em dezembro de 1975, a Indonésia – que divide ilha com Timor Leste, ficando com a porção oeste – iniciou a invasão
do território timorense, anexando-o ao país.
Com 35 mil soldados no vizinho e amplo domínio via terra e mar, os indonésios – com o apoio dos Estados Unidos, apenas na retórica – ocupou Timor Leste, rico em óleo e
gás, contra a vontade dos nativos, que queriam preservar a identidade nacional. Uma guerrilha timorense foi formada e durante 24 anos disputou território com os
indonésios, que acabaram cedendo à pressão internacional apenas em 27 de setembro de 2002, data da entrada de Timor Leste nos quadros da ONU – estima-se que entre 60
mil e 200 mil pessoas morreram nos confrontos de duas décadas.
SELECAO NACIONAL
Com cerca de um milhão de habitantes (dados de 2010), o futebol de Timor Leste, cuja população fala português e tetum (idioma local), começou a ser jogado oficialmente
após a independência. A primeira partida consta de 21 de março de 2003, derrota de 3 a 2 para Sri Lanka, naquele país.
O primeiro ponto só aconteceria cinco anos depois, em 19 de outubro de 2008, num 2 a 2 com Camboja, em jogo válido pelas eliminatórias da AFF Suzuki Cup 2008. A
vitória inaugural, pasme-se, ocorreu há pouco tempo, em 5 de outubro de 2012, uma goleada de 5 a 1 sobre a mesma seleção cambojana, pelo qualificatório da AFF Suzuki
Cup 2012.
O primeiro torneio que a nova seleção asiática disputou foi a AFF Suzuki Cup 2004, quando perdeu as quatro partidas pelo Grupo B, terminando na lanterna, com apenas
dois gols marcados e 18 sofridos – fizeram parte da chave Myanmar Malásia, Tailândia e Filipinas e a maior goleada sofrida foi 8 a 0 para os tailandeses.
Com elenco formado por atletas locais e reforçado com o zagueiro português Alfredo Esteves, que defendia o modesto Oliveira do Bairro (Portugal), hoje na quarta
divisão nacional – o atleta ainda veste a camisa da seleção timorense, aos 36 anos –, Timor Leste demorou a conseguir bons resultados. Nos Jogos da Lusofonia de 2006,
o time perdeu os dois confrontos da primeira fase, contra Moçambique e Angola, ambos por 5 a 0, o que não deixou de ser um aprendizado internacional diante de
adversários mais gabaritados.
Pode parecer improvável, mas já em 2007, apenas quatro anos depois do primeiro jogo oficial, a seleção asiática participou das eliminatórias para a Copa do Mundo 2010.
Em 21 de outubro, 1.500 torcedores estiveram presentes no estádio Kapten I Wayan Dipta (25 mil pessoas), em Gianyar, na Indonésia, para acompanhar a partida diante de
Hong Kong. O adversário venceu, mas o placar de 3 a 2 até animou os nativos. Bem pior foi o desempenho na casa do oponente, goleada de 8 a 1 e eliminação na fase
preliminar.
Quatro anos depois, no qualificatório para o Mundial do Brasil 2014, Timor Leste novamente mostrou força ao perder de apenas 2 a 1 para o Nepal, fora de casa. No jogo
da volta, mais uma vez em solo nepalês – a Fifa não permitiu que o jogo fosse em Timor Leste, por falta de infraestrutura –, os adversários golearam por 5 a 0 e
seguiram em frente.
A melhor campanha no torneio do leste asiático (AFF Suzuki Cup) aconteceu no qualificatório para 2012. Timor Leste não conseguiu se classificar para a fase final, mas
somou seis pontos em quatro rodadas, ficando com a terceira posição, atrás de Mianmar (dono da casa) e Laos, que somou sete, os dois que seguiram para o campeonato em
si – além da goleada sobre Camboja, a primeira da história, os timorenses venceram Laos por 3 a 1.
SANGUE TUPINIQUIM
Mas qual o motivo da evolução de Timor Leste no futebol internacional, com duas participações consecutivas em eliminatórias e derrotas por apenas um gol de diferença?
É simples: a ajuda dos brasileiros. O pioneiro a desembarcar na ex-colônia portuguesa foi o técnico Antônio Carlos Vieira, em 2010, que além de trazer jovens atletas
brasileiros, que chegaram a fazer parte da seleção sub-23 de Timor Leste, ajudou a desenvolver o futebol.
Vieira tinha a experiência de ter comandado a seleção de Belize (2006-07), além de Paraná (2001 e 2004) e Floriana (Malta), seus mais importantes trabalhos. Junto com
ele, vieram seis jogadores desconhecidos, com destaques para o zagueiro Diogo Rangel (ex- Palmeiras B e Vasco, hoje atua no Sriwijaya/Indonésia), o lateral esquerdo
Rocha, que chegou a atuar nas bases de São Paulo e Fiorentina (Itália), e o atacante Murilo de Almeida, revelado no Bahia e hoje no Busaiteen Club (Bahrein).
Em 2012, Antônio Carlos Vieira deixou o projeto de Timor Leste seduzido por uma vaga no Phoenix Monsoon (Estados Unidos), da quarta divisão, mas o trabalho na seleção
asiática continuou com os tupiniquins: Emerson Alcântara, de 42 anos, zagueiro que teve de encerrar a carreira profissional aos 26 anos por causa de acidente
automobilístico – jogava no Belenenses (Portugal) –, aceitou o desafio de tornar o futebol timorense uma potência no leste da Ásia.
Com experiência em vários times pequenos do interior paulista, além do Bucheon (Coreia do Sul) e do North East Stars (Trinidad & Tobago), Alcântara passou a comandar
oito jogadores de Timor Leste, seis do Brasil, dois da Austrália, um de Portugal e um da Indonésia. Obviamente, há muito a ser feito no futebol nacional, que ainda
atravessa graves problemas de infraestrutura. Vieira, por exemplo, disse que Timor Leste será uma potência da região em 2020…
CURTAS
- Timor Leste tem 27 jogos oficiais na história, com duas vitórias, um empate e 24 derrotas. A equipe marcou 30 gols, levando 96. Os timorenses enfrentaram os rivais
indonésios em duas oportunidades, ambas em amistosos. Em 2010, 6 a 0 para o adversário, que voltou a vencer em 2012, por 1 a 0, o último jogo do país – a partida não
foi reconhecida pela Fifa.
- Emerson Alcântara encarou as duas primeiras vitórias na história, durante as eliminatórias para a AFF Suzuki Cup 2012, como um marco para a população: “Creio que
cerca de 70% dos timorenses é pobre. Então, essas vitórias são importantes para o povo, que adora futebol e pode ganhar confiança e ter orgulho dos resultados. É muito
importante para nós motivar nosso povo e ajudá-lo a mudar de vida”, disse à imprensa nacional.
- A evolução de Timor Leste pode ser percebida também no Ranking da Fifa. A pior posição na história foi em outubro de 2012, o 206º lugar. O melhor resultado ocorreu
em dezembro de 2012 e em janeiro de 2013, a 182ª posição. Atualmente (março de 2013), Timor Leste ocupa a 186ª colocação, atrás de Suazilândia, Camboja e Guiné Bissau,
mas à frente de Madagascar, Tonga e Andorra.